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A PÓS-APOSENTADORIA

A aposentadoria é um desafio difícil de ser enfrentado por pessoas e governos. Primeiro porque o mundo envelhece depressa e segundo porque estamos vivendo mais tempo. No final, a conta não fecha. Viver mais, custa mais.

Nos Estados Unidos, a aposentadoria por idade exige 67 anos para homens e mulheres, mas pode ser antecipada para 62 anos caso a pessoa opte por um desconto no valor da aposentadoria. O sistema é muito diferente do Brasil, onde a contribuição mínima é de 30 anos para mulheres e 35 anos para homens.

Nos Estados Unidos, pessoas 65+ totalizavam 55,8 milhões em 2021, ou cerca de 16,8% da população do país. Até 2040, essa proporção deve crescer 22%. O objetivo essencial da aposentadoria é substituir parte do valor que a pessoa recebia quando trabalhava, não sendo representado pelo valor integral do salário.  O benefício é calculado conforme a média dos salários que a pessoa recebeu ao longo da vida. O Social Security recomenda que os trabalhadores contem com outros valores que se somem à aposentadoria, como investimentos e poupanças, para ter a garantia de uma renda suficiente para manter um bom padrão de vida. Porém, a maioria dos cidadão não conseguem essa proeza, nem lá nem cá.

A Mercer, empresa do grupo Marsh McLennan, líder mundial nas áreas de risco, estratégia e pessoas, divulga um ranking anual com os melhores e piores sistemas de aposentadoria. Segundo o índice de 2023, a Holanda apresenta o melhor sistema de aposentadoria do mundo, entre 47 países pesquisados. O Brasil aparece na 33ª posição, à frente do Peru (34º) e da China (35º).

A Argentina, onde pensões se desvalorizam com a inflação galopante, ocupa o último lugar entre os países pesquisados, enquanto os Estados Unidos ocupam o 22º lugar – duas posições abaixo do ano passado. A Austrália está em 5º lugar, o Reino Unido em 10º e o Japão em 30º.

A consultoria destaca que os sistemas previdenciários da maioria dos países estão sob estresse devido a fatores conhecidos: envelhecimento acelerado da população, aumento da dívida pública e à inflação elevada, além de enfrentarem o desafio de gerar novos empregos. Sem contar no impacto que as novas tecnologias, como IA por exemplo, irão exercer no mercado de trabalho.

David Knox , sócio sênior da Mercer, avalia que os cidadãos terão que cuidar de si mesmos na aposentadoria: “Não podemos confiar apenas nos sistemas de seguridade social ou nos valores pagos pelos governos”. Eu completo dizendo que não basta cuidar só da aposentadoria, que é um direito assegurado por lei. É preciso cuidar também – e principalmente – da pós-aposentadoria, este novo ciclo que se chama longevidade. E aí, o bicho pega, porque esse tema é uma novidade planetária.

O Brasil também está envelhecendo depressa: duas pessoas completam 60 anos por minuto em nosso país. O cenário econômico é bem diferente, mas o desafio é similar aos demais países. O salário mínimo atual, que é a base de cálculo dos benefícios previdenciários e assistenciais, é de R$ 1.320,00, e deverá subir para R$ 1.421 a partir de janeiro de 2024, conforme previsão orçamentária do governo federal. O aumento será de 7,65%.

Além da inflação deste ano, estimada em 4,48%, o piso salarial terá mais 2,9% de correção, que é a variação do PIB (Produto Interno Bruto) de dois anos antes, conforme a política de valorização salarial do Executivo. O valor final do salário mínimo, no entanto, pode sofrer variações até 1º de janeiro de 2024, se houver mudança nos números da inflação de 2023. Isso porque ela só é divulgada no início do ano.

NOVA JORNADDA

A aposentadoria é o começo de uma nova jornada, para a qual a maioria dos brasileiros precisa se preparar melhor. Seis em cada dez aposentados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) recebem um salário mínimo, incluindo quem tem direito à aposentadoria, pensão ou auxílio. Ou seja: dos 39 milhões de aposentados do país, mais de 23 milhões sobrevivem com um salário mínimo, um número que corresponde a mais de 3 vezes a população de Portugal. Aqui nos Estados Unidos, esse valor corresponde a menos de 300 dólares. E tem mais: 52% dos aposentados são responsáveis pelo sustento de suas famílias, segundo pesquisa CNDL/SPC Brasil. Confesso que não sei qual a fórmula mágica que eles utilizam. São os nossos heróis invisíveis, que muitos celebram, mas poucos vêem de fato.

Por essas e por outras é que devemos debater sistematicamente esse tema, pois os números e a realidade nos mostram – não apenas no Brasil, mas em diversos países – que será preciso encontrar mecanismos de geração de renda para essa população, pois eles ainda são responsáveis por boa parte do custo de manutenção de suas famílias. Quando uma filha casa, engravida e se separa, volta a morar com a mãe. Quando um filho fica desempregado, volta a morar com o pai. Os pais não abandonam os filhos, mas a recíproca nem sempre é verdadeira.

Os experientes querem e podem seguir ativos. Basta que a oferta de oportunidades seja real e justa e o etarismo extinto. Trata-se de um desafio que não cabe apenas a governos, as empresas e a sociedade precisam entrar em cena, para evitar que o envelhecimento seja um bônus e não um ônus. Porém, para isso acontecer, o tema não pode ser mantido em segundo plano, pois todos perdem com isso. A experiência é um ativo valioso. Só não vê quem não quer.

RICARDO MUCCI

Jornalista e palestrante. Arquiteto de inovações de impacto socioeconômico. Integrante do Conselho do Idoso de S. Paulo. Ajudo a repensar a longevidade e a maturidade moderna.

 

FOTO DE CAPA: IMAGEM DE FREEPIK

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