Artigo

EDITORAL EDIÇÃO N.º 7 – REVISTA ENVELHECER

“Há o que celebrar neste Dia das Pessoas Idosas?” é o título do artigo de opinião, de Alexandre Kalache, publicado no dia 29 de setembro,  na Secção Como Chegar Bem Aos 100, na Folha de São Paulo, dedicada à longevidade que integra os projetos ligados ao centenário da Folha, celebrado neste ano de 2021.

Entrevistamos, nesta edição, Alexandre Kalache, médico gerontólogo ex-diretor do Programa Global de Envelhecimento e Saúde da OMS (Organização Mundial da Saúde), e falaremos de idadismo, das cidades amigas das pessoas idosas, da classificação da velhice como doença, dos gerontoloscentes, da nova longevidade, do marco político do Envelhecimento Ativo e Saudável, da Década para o Envelhecimento 2020-30…

Na sua crónica, tendo como mote o Dia Internacional das Pessoas Idosas, assinalado mundialmente no dia 01 de outubro, recorda com saudade e admiração a criadora desta efeméride, a embaixadora permanente da República Dominicana nas Nações Unidas, Julia Alvarez: “Em todos os aspetos, uma mulher excecional que exerceu a função, voluntariamente, de 1978 até completar 84 anos. Tenaz, audaciosa, dotada de uma notável erudição. E sedutora, cativante, determinada. Ela ficou conhecida no circuito diplomático de Nova York como a “Embaixadora do Envelhecimento”. Transcrevo também a resposta à sua pergunta inicial: “Mas quantas centenas de milhares de pessoas idosas já não estão entre nós para celebrá-lo, vítimas da pandemia. E quantos mais milhares sentirão a saudade eterna de seus entes queridos –cônjuges, filhos, netos, amigos próximos, comunidades inteiras carentes da presença daqueles que, prematuramente, se foram. Perversamente, na semana dedicada às pessoas idosas, chegaremos no Brasil a 600.000 mortes por Covid-19. Nossa taxa de mortalidade causada pela pandemia é três vezes superior à média mundial. Mais de 70% das mortes foram de pessoas acima dos 60 anos. E daí? São velhos, morrer é função de estarmos vivos –alguns dizem.”

E no nosso país, teremos motivos para celebrar o Dia Internacional das Pessoas Idosas?

SIM, se pensarmos que Portugal tem uma das maiores esperanças de vida do mundo. De acordo com os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), de 24 de setembro de 2021, a esperança de vida à nascença é de 81,06 anos, sendo de 78,07 para os homens e 83,67 para as mulheres. A esperança de vida aos 65 anos, é de 19,69 anos, 17,76 para os homens e 21,11 para as mulheres. De acordo com a informação da Euromonitor Internacional & Ageing Europe (2019); Portugal é o quinto país mais envelhecido do mundo e, em 2050, será o país mais envelhecido da União Europeia.

NÃO, se observarmos a informação plasmada no documento Alterações demográficas na Europa – Fichas informativas por país: Portugal, EUROSTAT”, segundo o qual os portugueses terão apenas 58,6 anos de vida saudável, as mulheres 57,5 e os homens 59,8. Facilmente se conclui que os portugueses vivem muitos anos (Homens – 28,27 / Mulheres – 25,97) sem saúde, sem qualidade de vida, fragilizados, perdendo capacidade funcional e autonomia, dependentes e, este é um tema que merece a nossa atenção, estigmatizados, discriminados, estereotipados, no limite, abusados e mal tratados. A este assunto se dedica o Movimento Stop Idadismo ao qual daremos o merecido destaque na próxima edição.

Googlámos a palavra idoso, precisamente no Dia Internacional da Pessoa Idosa. As 3 notícias em destaque eram: Pedidos de ajuda de idosos à APAV sobem há três anos (Zulay Costa, JN); Estudo indica que um em cada quatro idosos se sente só e tem sintomas depressivos (Observador); APAV abre mais de 10 mil processos por violência contra idosos entre 2013 e 2020 (RTP).

Portugal deve, urgentemente, pensar em estratégias que respondam aos desafios demográficos de uma pirâmide etária que se inverte a cada dia que passa, com o estreitamento progressivo da base – há uma crise de natalidade, agudizando a incapacidade de substituição das gerações – e uma dinâmica inversa no topo com o seu constante alargamento. Segundo o Eurostat, Portugal registou uma percentagem de 22,1% de pessoas com mais de 65 anos em 2020, a quarta mais alta da UE, acima da própria média europeia que se fixou em 20,6%. Olhando para o histórico dos últimos 10 anos, este indicador tem registado uma tendência crescente.

Tendo em linha de conta os anteriores considerandos, não se compreende porque razão não foi, até à data, dada sequência à proposta apresentada pelo Grupo de Trabalho Interministerial (Despacho n.º 12427/2016) para uma Estratégia Nacional para o Envelhecimento Ativo e Saudável 2017-2025 (10 de julho de 2017). Desperdiçados mais de 4 anos, eis que, para dar resposta à pandemia, foi publicada a resolução da Assembleia da República n.º 146/2021 que “Recomenda ao Governo a adoção de medidas de promoção do envelhecimento ativo e saudável e de proteção da população idosa no contexto da pandemia da doença COVID-19.” [1]

É urgente repensar as políticas públicas de modo a potenciar a correta e efetiva integração da longevidade na sociedade. A pandemia visibilizou muitas das dificuldades que este grupo sente no quotidiano. Não podemos deixar que aconteça o que descreve uma das maiores estudiosas da velhice no Brasil, a antropóloga Mirian Goldenberg: “A velhofobia é escancarada, saiu do armário e está se legitimando como discurso.”

Temos que ouvir as pessoas mais velhas, tirá-las da invisibilidade, dar atenção aos seus interesses, vontades e projetos, respeitar os seus direitos e a sua integridade, autonomia e independência. Este é o propósito desta revista, um propósito que se cumpre em cada artigo escritos pelos articulistas que generosamente contribuem com o seus saber e experiência, nas mais diversas áreas. Uma vez mais, BEM HAJAM!

Note bem, caro leitor, o Papa Francisco, num discurso, bem recente, na Academia Pontifícia, falou numa “eutanásia disfarçada”, reprovando o tratamento, como “lixo” a que muitos são sujeitos, sendo-lhes, por motivos económicos, recusados os medicamentos de que precisam. No japão são cometidos pequenos delitos para combater a solidão na prisão, um sinal dos tempos que pode ler nesta edição.

Cumpre-nos manter a chama da esperança acesa, agirmos e nunca desistirmos. É o que fazemos em cada caracter que digitamos, dando a conhecer biografias deliciosas – já conhecem a Glória Rabelo? – e projetos que reforçam a nossa missão: Soledad No Deseada[2]; “Ijubilables”; #MesMundialAlzheimer; Stop Idadismo…

 

José Carreira 

FOTO: CAMPANHA PIKOLIN

 

[1] https://www.sns.gov.pt/wp-content/uploads/2017/07/ENEAS.pdf

[2] https://soledadnodeseada.es/

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