Artigo

INCLUSÃO DA PESSOA SURDA NO ESPAÇO CULTURAL

Não consigo construir uma casa pelo teto.

Não consigo falar deste vasto tema, mesmo que segmentado à área da cultura, sem o sustentar…

Não existe uma flor, sem iniciar o seu ciclo na semente…

Tudo isto para explicar que a Inclusão,  na sua forma mais abrangente, é a aplicação prática da disponibilização dos territórios adaptados às necessidades de todas as Pessoas que o compõem.

Na prática o que significa “adaptar os territórios às necessidades…. de Todos e Todas”?

Não há Pessoas ditas normais, há Pessoas, umas são  bebés, outras crianças, outros jovens, outras adultas, outras mais sábios (os mais velhos, claro)…. Dentro destes, todos têm necessidades especiais para estarem e sentirem a pertença ao seu território. Por exemplo, os passeios devem ser acessíveis para quem quer correr, para quem é cego, para o “sábio” que cansado de tanta sapiência, vai espairecer num passeio à beira mar, com a sua bengala para não perder o equilíbrio …

E a Pessoa surda como se adapta ao seu território?

A Pessoa surda, apenas precisa que o seu território, disponibilize acessibilidade à comunicação , que para este público-alvo, passa pela Língua Gestual.

Neste caso, para a Inclusão da Pessoa Surda no espaço cultural, (porque pediram-me para focar no espaço cultural) é preciso que todos os equipamentos culturais, disponibilizem todos os conteúdos em Língua Gestual.

A Língua Gestual é a Língua materna da Pessoa Surda.

Eu agora, nesta pandemia sobretudo com as novas regras de máscara, no espaço publico, fechado ou ao ar livre, costumo dizer, que o vírus trouxe a sensação de surdez generalizada,… muitas vezes, damos-nos enervados, porque não percebemos o que o outro disse… tudo por causa do som abafado que sai quando temos a máscara…. estamos a falar de momentos… e eu aproveito sempre, a minha tenacidade neste assunto, para provocar uma reflexão: a Pessoa Surda está permanentemente nesta inquietude não por momentos, não por não perceber umas palavras, mas porque esteve e está sempre fora do contexto, desde que nasceu….

Arrepia só de sentir ….

A Pessoa Surda comunica entre os seus pares em Língua Gestual. Muitas surdas e surdos não fazem a interpretação do texto escrito, pelo que a leitura não é a solução para uma  acessibilidade eficaz.

Para que as Surdas e os Surdos tenham acesso à Língua Gestual no espaço cultural precisamos se dar voz às mãos , isto é, interpretar e/ou traduzir a mensagem falada ou escrita em Língua Gestual.

Ora vamos clarificar as situações, em que no espaço cultural, deve permitir que a Pessoa Surda possa participar no espaço cultural, com acesso à Língua Gestual:

– Espetáculos de teatro

– Espetáculos de comédia

– Espetáculos musicais

– Espetáculos com contadores de histórias

– Apresentações de escritores em Feira de Livros

– Todos as atividades politicas formais ou não formais

– Todas as visitas históricas guiadas, aos territórios ou a partes temáticas deles

– Todos os Museus devem disponibilizar todo o seu conteúdo também em Língua Gestual.

– Espetáculos de futebol  – claques que se expressem também em Língua Gestual constituídos por surdas e surdos

– Toda a comunicação web, disponibiliza-la em Língua Gestual

 

Enfim…

Sou CODA (Children of Deaf Adults), sou filha de Pais surdos profundos, dependentes da Língua Gestual para comunicar, senti o peso desta sobrevivência inaceitável, porque os meus Pais só tinham acesso ao Mundo quando eu lhes colocava a voz das Pessoa falante, nas minhas mãos… às vezes sentia tanta fúria quanto a que eles sentiam pela ausência permanente desta inter-acção….

Todos podemos Ser melhor, desde que os territórios e as suas cidadãs e cidadãos aprendam Língua Gestual para interagir com a Pessoa Surda, que não pode ouvir, mas quem ouve pode aprender a falar com as mãos.

O Mundo será melhor quando incluirmos todas as Pessoas, nomeadamente a Pessoa Surda…. e a Língua Gestual é tão linda!

Vamos dar fala às nossas mãos, para que elas sejam a voz de quem precisa de “ouvir” lendo-as.

 

CODA – Interprete de Língua Gestual (Residente do Porto Canal)

Amélia Amil

 

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