No Diário de Viseu, de 10 de novembro de 2021, teve honra de capa a fotografia de um Judoca de Viseu com o título “Boloto responde com bronze a quem o chamou ‘velho’”. 14 dias depois, António Boloto somou mais um título, desta vez sagrou-se Campeão Nacional de Séniores. O atleta e treinador recordou um episódio em que foi apelidado de “velho” quando pediu o apoio a uma instituição viseense: “Há tempos disseram-me que era velho demais para competir. Foi pedido um apoio a uma instituição desta cidade e disseram isso (…)”. Os senhores que apelidaram o judoca de velho estão desatentos, têm-se ultrapassado muitas barreiras etárias também no mundo do desporto. Vamos ao desporto rei e à nossa elite desportiva. Com 38 anos, o central Pepe tornou-se o jogador mais velho a jogar pelo FC Porto. Cristiano Ronaldo, aos 36 anos, é um exemplo de longevidade e sucesso na alta roda do futebol mundial. Facto que levou Pepe Guardiola, consagrado treinador do Manchester City, a brincar com a longevidade de Cristiano Ronaldo: “Ronaldo vai marcar golos durante toda a sua vida. Vai ter 75 anos, talvez aposentado, mas estará no seu próprio churrasco a jogar e a marcar golos”.
O idadismo continua a ser um preconceito muito enraizado na sociedade. A discriminação em função da idade refere-se à forma como pensamos (estereótipos), sentimos (preconceitos) e agimos (discriminação) em relação a outras pessoas ou a nós próprios por razões relacionadas com a idade. Temos imensos exemplos que nos devem impelir a agir, a sermos anti-idadistas, denunciarmos e pugnarmos por uma sociedade para todas as idades, inclusiva:
A cantora Ana Bacalhau, também vocalista dos Deolinda, disse, em entrevista ao Diário de Notícias (20/11/2021) :“Continuamos a ver que as mulheres a partir dos 40 anos deixam de aparecer nas televisões, nos media mainstream, nos grandes concertos. Se formos ver, não há muitos exemplos de mulheres com 50 a 60 anos a aparecer, enquanto os exemplos masculinos abundam – aí a idade pesa muito. Provavelmente terá que ver com a ainda pouca aceitação do envelhecimento feminino.”
O jornalista Júlio Magalhães, em entrevista à revista LUZ (20/11/2021): “Foi uma grande surpresa com esta idade receber este convite é verdade. [Júlio Magalhães foi convidado para integrar a CNN Portugal] Não estava mesmo à espera. Integrar um projeto destes aos 58 anos… Eu espero que seja um bom exemplo e uma inspiração. Se reparar a CNN americana é feita de cabelos brancos, de jornalistas seniores, que chegam à apresentação de progranas, de telejornais, depois de muitos anos de reportagem… Nós não temos muito essa cultura em Portugal. O que acontece em Portugal é que os jornalistas com idade andam a arrastar-se pelas redações. Os cabelos brancos e pessoas com experiência – sobretudo na televisão – hoje interessam pouco. Deixou de haver memória nas redações. Não estou a dizer que está mal. Muita gente jovem que entra na televisão tem muito valor e tem dado provas disso. Mas a verdade é que hoje chega-se a uma determinada idade e sai-se do ecrã e já não se tem lugar garntido só porque se tem mais idade. É pena que em Portugal a experiência não conte: temos tantos jornalistas e tivemos tantos ao longo dos anos que abandonaram o jornalismo, que deixámos de os ver – na televisão, na rádio, nos jornais – precisamente porque se achou que esta cultura, que existe hoje, é a cultura da beleza, da novidade, das pessoas mais novas… pessoas mais novas também com valor e capacidades, mas foi pena não termos feito na comunicação em Portugal um mix e uma junção entre aquilo que é a novidade – gente jovem, que é necessário entrar no mercado – e a experiência, que é muito importante estar nas redações.”
O idadismo é uma das maiores violências contemporâneas. O preconceito por idade segue-se ao racismo e ao sexismo, como a terceira forma de discriminação que mais afeta as pessoas no mundo. Os 79 anos do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, têm sido alvo dos comediantes dos talk shows da televisão americana:
“Para dar uma ideia de quão velho é isso, Bill Clinton, lembra-se dele? Foi presidente quase há 30 anos atrás, ele agora tem 75.” (Jimmy Kimmel, ABC)
“O médico da Casa Branca diz que ‘Biden é macho saudável e vigoroso’. Vigoroso. Porque todo o check-up presidencial parece anúncio de Cialis? Nem os mais governamentais, como Setephen Colbert, da CBS, aliviaram: ‘Estava meio que torcendo para que descobrissem que ele tem aquela doença de Benjamin Button.”
“Nem acaba o mandato. Está claramente deteriorado e senil” (Britt Hume, Fox News)
Também a esposa do presidente americano, Jill Biden, foi vítima de idadismo e sexismo. Os “polícias de costumes” criticaram a saia curta e as meias rendadas, um look demasiado sexy para alguém com a sua idade. O site francês Au Feminin critica Brigitte Macron porque “usa saias curtas demais para sua idade”. São bastante comuns os exemplos de interseccionalidade de preconceitos como o idadismo e o sexismo. Um exemplo claro e recente é o ataque vil que Bolsonaro desferiu ao presidente francês, Emmanuel Macron, em resposta às críticas que este fez à catástrofe ambiental que está à vista de todos, no pulmão do mundo, na Amazónia. O presidente brasileiro respondeu ao comentário de um seguidor que comparou a beleza da esposa de Macron à de Michelle Bolsonaro, que é 29 anos mais jovem: “Agora entende por que Macron persegue Bolsonaro?”, escreveu o seguidor, na legenda da foto dos casais. “Não humilha cara. Kkkkkkk”. Temos que ser anti-idadistas e combater o preconceito através da Política e da Legislação, das Atividades educativas e das Intervenções intergeracionais. Encaremos a longevidade como uma oportunidade e não uma fatalidade. Citando Alexandre Kalache, “Envelhecer é bom, morrer é que não presta!” #StopIdadismo.
José Carreira
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