Artigo

Um dia seremos velhos

Pode ser uma simples piada sobre a idade, ou algo mais sério, como a rejeição no mercado de trabalho. O chamado idadismo é ainda pouco debatido, mas a ONU dedicou-lhe um relatório em março e as conclusões são avassaladoras: uma em cada duas pessoas tem atitudes discriminatórias em função da idade. A edição de hoje da “Notícias Magazine” é dedicada ao envelhecimento ativo, mas não escondemos as sombras e os preconceitos que nos levam a ver a idade como um fardo.

Criado em abril, o movimento Stop Idadismo Portugal tem entre os seus objetivos a sensibilização para a violência contra a pessoa idosa e os números divulgados estes dias pela APAV são assustadores. Os crimes aumentam ano após ano e só nos últimos oito perto de 8500 idosos foram maltratados. O retrato de 2020 mostra mais de uma centena de vítimas acima dos 90 anos, 74 das quais eram agredidas há décadas.

Intuitivamente, todos conhecemos histórias de fragilidade e de abandono e a pandemia evidenciou ainda mais as condições de solidão em que vivem muitos dos nossos idosos. Mas discutimos pouco o que fazer para melhorar as condições de vida de quem é atingido por situações de particular vulnerabilidade. E discutimos ainda menos como mudar os estereótipos sobre a idade ou como ouvir e respeitar quem tem tanto para dar e ensinar à sociedade.

A esperança média de vida aumenta e Portugal é o quarto país da União Europeia com mais população acima dos 65 anos. A questão, contudo, é o que fazemos para que mais tempo seja sinónimo de mais qualidade. E o que fazemos para nos consciencializarmos, em devido tempo, que a fragilidade é a nossa condição. Um dia seremos velhos, até os que se julgam imortais. Mas nem todos seremos sábios. Essa é uma bênção que está reservada a quem valoriza mais os outros e o espanto de estar vivo do que as suas autossuficiências.

INÊS CARDOSO

Diretora do Jornal de Notícias  

 

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